Ultra Fast Fashion: a nova face do consumo que está destruindo o planeta e explorando pessoas

Publicado em 4 de junho de 2025 às 13:29

Se você acha que o fast fashion já era problemático, prepare-se para conhecer uma versão ainda mais acelerada e agressiva: o ultra fast fashion. Esse modelo de negócio surgiu para transformar tendências virais em produtos prontos em tempo recorde, muitas vezes em questão de horas. Marcas como Shein, Temu e Cider são alguns dos nomes que popularizaram essa lógica de produção massiva, barata e extremamente veloz.

Mas o que isso significa na prática? Significa que enquanto você assiste um vídeo no TikTok com uma nova trend, uma empresa na China já está produzindo uma peça igual para colocar à venda no mesmo dia. E tudo isso graças ao uso pesado de dados, algoritmos e inteligência artificial, que rastreiam em tempo real o que está em alta nas redes. De acordo com um relatório da empresa de análise de mercado Rest of World (2022), a Shein chega a lançar até 10 mil novos produtos por dia, um volume jamais visto na indústria da moda.

Parece prático, moderno e acessível, certo? Mas o custo real dessa velocidade não aparece no preço da etiqueta. Ele está escondido nos bastidores.

Por trás dessas roupas superbaratas existem trabalhadores, na maioria das vezes em situação de extrema vulnerabilidade. Uma investigação do jornal britânico Channel 4 (2022), junto com a organização Public Eye, revelou que trabalhadores em fábricas que produzem para a Shein chegam a fazer jornadas de 18 horas diárias, com apenas um dia de folga por mês. Muitos são imigrantes internos na China, trabalhando sem contrato, sem seguro e sem direitos trabalhistas. O pagamento, na maioria dos casos, é feito por peça produzida — o que pressiona ainda mais por ritmos insanos de produção.

E não para por aí. O impacto ambiental desse modelo é assustador. Segundo a Fundação Ellen MacArthur (2017), a indústria da moda gera cerca de 92 milhões de toneladas de resíduos têxteis por ano. E uma parte crescente desse lixo é consequência direta do ultra fast fashion. Só no deserto do Atacama, no Chile, são descartadas anualmente mais de 39 mil toneladas de roupas usadas, muitas delas vindas dos Estados Unidos, Europa e Ásia, conforme reportagem da AFP (2021).

Além disso, o ultra fast fashion alimenta uma cultura de ansiedade e insatisfação constante. A lógica é simples: se tudo muda o tempo todo, você nunca se sente suficiente. Nunca tem roupa nova o bastante, nunca está estiloso o bastante, nunca está atualizado o bastante. Estudos como o da pesquisadora Dana Thomas, no livro "Fashionopolis" (2019), mostram como essa lógica de consumo rápido afeta diretamente a saúde mental, especialmente de jovens que crescem sendo bombardeados por trends instantâneas nas redes sociais.

O mais louco é que, mesmo quem nunca comprou de uma marca como Shein é afetado por esse sistema. Ele pressiona toda a cadeia da moda. Marcas pequenas, produtores locais e até brechós precisam competir com peças que custam menos que uma refeição. Isso distorce completamente o valor do trabalho, do design e dos materiais.

Diante disso, fica uma pergunta que não dá mais pra ignorar: até quando a gente vai aceitar que roupa é descartável?

A saída existe, mas exige consciência. Comprar de marcas que trabalham com responsabilidade, consumir menos, valorizar brechós, customizar, trocar, consertar. E, principalmente, entender que estilo não tem nada a ver com quantidade, mas com expressão, autenticidade e escolhas alinhadas aos nossos valores.

Falar sobre ultra fast fashion não é só sobre moda. É sobre trabalho, meio ambiente, saúde mental e futuro. E se tem uma coisa que esse futuro precisa é de mais gente disposta a fazer diferente.


Fontes e referências

  • Rest of World. Inside Shein: How the Chinese fast fashion giant is radically reshaping online shopping. 2022.

  • Channel 4. Untold: Inside the Shein Machine. Documentário. 2022.

  • Public Eye. Shein: Investigation into Labour Conditions. 2021.

  • Fundação Ellen MacArthur. A New Textiles Economy: Redesigning Fashion’s Future. 2017.

  • AFP. Desert of Atacama: Chile’s fast fashion graveyard. 2021.

  • Dana Thomas. Fashionopolis: The Price of Fast Fashion and the Future of Clothes. 2019.

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